Aliança legislativa pode barrar pedágios

Pressão sobre pedágios une parlamentares
pedagio nao pedagio nao
Populares manifestaram insatisfação com a proposta do governador Romeu Zema. Foto: Ramon Bitencourt/ALMG.

A proposta do Governo de Minas Gerais para instalar 12 pórticos de pedágio em rodovias que cortam a Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH) e municípios do entorno da capital tem encontrado forte resistência de representantes dos legislativos estadual e municipais. A união de forças entre deputados e vereadores de diferentes correntes políticas está se consolidando como um movimento inédito e articulado para tentar impedir a medida.

Na última quinta-feira (20), uma audiência pública realizada na Câmara Municipal de Belo Horizonte reuniu parlamentares estaduais e vereadores das cidades diretamente afetadas pela proposta de pedágios, como Vespasiano, Pedro Leopoldo e Confins. Todos os presentes se posicionaram contra a concessão das rodovias e a consequente cobrança de tarifas de pedágio.

A deputada estadual Beatriz Cerqueira (PT), integrante da Comissão de Administração Pública da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), propôs o fortalecimento do diálogo entre os poderes legislativos municipais e estadual como estratégia para barrar o avanço do projeto de novos pedágios. Segundo ela, “é preciso constituirmos parcerias entre os legislativos para proteger a população”.

PEC e projeto tentam impedir tarifas

Na ALMG, duas proposições já foram protocoladas com o objetivo de proibir a cobrança de pedágio em regiões metropolitanas. A primeira é a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 49/25, de autoria da deputada Bella Gonçalves (Psol), que argumenta que a proposta do Executivo vai na contramão dos princípios de integração das regiões metropolitanas, dificultando a mobilidade e penalizando, sobretudo, a população de menor renda.

A segunda proposta é o Projeto de Lei (PL) 3.320/25, assinado pelo deputado Bruno Engler (PL). O parlamentar também questiona a viabilidade e justiça da medida, destacando que o impacto recairá sobre milhares de trabalhadores que se deslocam diariamente entre os municípios vizinhos e Belo Horizonte.

Críticas ao sistema de pedágio digital

Além da cobrança em si, o método escolhido para a implementação do pedágio também tem sido duramente criticado. O governo estadual pretende adotar o modelo de cobrança automática por meio de pórticos com sistema de leitura eletrônica — o chamado free flow. Neste sistema, não há cancelas, e os motoristas têm a tarifa debitada eletronicamente com base nas placas dos veículos.

A crítica principal gira em torno da falta de transparência no processo de cobrança. Segundo os parlamentares, muitos motoristas não estão cientes de como o sistema funciona e acabam sendo penalizados indevidamente. O deputado Bruno Engler alerta para o fato de que o motorista que não quitar a tarifa dentro de 15 dias após o registro da viagem será automaticamente multado, sem qualquer aviso prévio. “O Estado se exime do ônus de cobrança”, protestou.

Multas e valores elevados assustam usuários

O vereador Wanderley Porto (PRD), autor do requerimento que originou a audiência pública, reforçou o argumento ao citar o caso do Rio Grande do Sul. Lá, onde o sistema free flow já está em vigor, mais de 254 mil multas foram emitidas, muitas por desconhecimento dos usuários sobre a forma de pagamento.

Porto destacou ainda os valores praticados: um trajeto de ida e volta entre Belo Horizonte e o Aeroporto de Confins, por exemplo, terá um custo estimado de R$ 18,06. Caso o pagamento não seja realizado, o motorista está sujeito a multa de R$ 195,00. “É um valor abusivo, que compromete o orçamento de trabalhadores que utilizam essas vias com frequência”, pontuou o vereador.

O vereador Dorivaldo Oliveira Teixeira (PSDB), de Vespasiano, também chamou a atenção para o impacto direto na população de seu município. Segundo ele, Vespasiano será atingida em duas frentes, já que ambas as rodovias que cruzam a cidade terão pórticos de cobrança. Isso pode dificultar o acesso à capital, inclusive para serviços de saúde.

Governo defende modelo de concessão

Em meio às críticas, o governo do estado defende a proposta como uma alternativa necessária diante da escassez de recursos públicos. Vítor Augusto Martins da Costa, subsecretário de Concessões e Parcerias da Secretaria de Estado de Infraestrutura, Mobilidade e Parcerias (Seinfra-MG), explicou que a concessão tem como objetivo atrair investimentos privados para melhorar a infraestrutura viária.

De acordo com Costa, o modelo prevê a instalação dos 12 pórticos com cobrança proporcional à distância percorrida e desconto de 50% para usuários frequentes. “Os investimentos públicos não são suficientes para atender à demanda por obras viárias de grande porte”, argumentou.

O subsecretário também afirmou que os contratos de concessão garantem o equilíbrio econômico-financeiro das empresas responsáveis pela operação das rodovias. Isso significa que, em caso de prejuízo, a concessionária poderá reajustar as tarifas ou receber compensações do Estado. Para os parlamentares, essa cláusula representa um risco de transferência do custo para a população.

Modelo de negócios é questionado

As deputadas Beatriz Cerqueira e Bella Gonçalves questionaram os critérios estabelecidos no edital de concessão. Para elas, ao garantir lucros às concessionárias mesmo diante de variações no número de usuários, o Estado está assumindo um compromisso financeiro que pode comprometer recursos públicos. “Se o lucro das empresas for ameaçado, quem paga é o povo”, disse Beatriz.

Bella Gonçalves foi além: “As obras serão custeadas pelo pedágio ou pelo próprio Estado. Em ambos os casos, a população pagará a conta, seja diretamente no bolso ou por meio do orçamento público”.

Mobilização regional ganha força

A união entre as casas legislativas municipais e estaduais está crescendo. A articulação entre vereadores e deputados tem buscado consolidar uma frente ampla contra a instalação dos pedágios. Municípios afetados têm promovido reuniões, audiências e manifestações para mobilizar a população e pressionar o Executivo estadual a recuar da proposta.

A expectativa é que, com o avanço do debate nas esferas municipais e na ALMG, o projeto encontre maiores obstáculos em sua tramitação. Os parlamentares também têm usado suas redes sociais e canais de comunicação para conscientizar a população e aumentar a adesão à causa.

Impactos sociais e econômicos no centro do debate

A proposta de pedagiamento em trechos urbanos e metropolitanos, que tradicionalmente não sofrem com grande deterioração de pavimento devido ao volume de tráfego leve, é vista como uma medida puramente arrecadatória. Os críticos apontam que a medida desconsidera a realidade socioeconômica das populações atingidas.

Para milhares de trabalhadores, estudantes e pacientes que precisam se deslocar diariamente entre municípios vizinhos e Belo Horizonte, o impacto financeiro pode ser significativo. Pequenos empreendedores, entregadores e motoristas de aplicativo também seriam fortemente afetados.

O modelo de concessão sem ampla participação popular e sem avaliação de impacto social é o que mais preocupa os opositores do projeto.

Perspectivas e próximos passos

A tramitação da PEC 49/25 e do PL 3.320/25 será acompanhada de perto por vereadores e deputados que integram o movimento contra os pedágios. A articulação também prevê a criação de frentes parlamentares regionais e a realização de novas audiências públicas para manter o tema em evidência.

A expectativa é que, com a pressão popular e o fortalecimento da união entre legislativos municipais e estadual, o governo estadual repense a implementação dos pórticos de pedágio na RMBH e região central de Minas Gerais.

A proposta, tal como está, encontra resistência técnica, política e social. A solução, segundo os parlamentares, está no diálogo, na transparência e na valorização da mobilidade como direito e não como fonte de arrecadação.

LEIA MAIS:

Obras do Metrô da RMBH avançam e governo mantém inauguração para 2026

Mantenha-se atualizado com as notícias mais importantes

Ao pressionar o botão Inscrever-se, você confirma que leu e concorda com nossos Termos de Uso e as nossas Políticas de Privacidade