Uma das últimas áreas verdes de preservação ambiental de Belo Horizonte, que abrange os mananciais do Cercadinho, a Estação Ecológica e a Mata do Jambreiro estão correndo sérios riscos de sofrer com a urbanização e o domínio de construtoras. Estes locais tão sensíveis e vulneráveis, de importante captação de água para grandes regiões da capital, como Barreiro e Centro-Sul, poderão em breve estar dividindo o espaço com rodovias e uma expansão desordenada do parque imobiliário da região.
Este local está situado às margens da linha férrea da Rede Ferroviária Federal S.A, com cerca de 50 hectares, na fronteira entre os bairros Vila da Serra e o Belvedere, divisa com Nova Lima. Um trecho desta área foi abraçado há muitos anos pelos moradores locais e pela Associação dos Amigos do Bairro Belvedere, que plantaram mais de 2 mil árvores transformando o local em um “Parque Linear”, com coleta de lixo e preservação, passando a ser um ponto de encontro de famílias que gostam de aproveitar a natureza, praticar esportes e curtir o pouco do verde que resta na capital mineira, além de ser um caminho de trilhas para os aventureiros.
O projeto que gera conflito
O risco do extermínio desta área se dá pelo possível leilão do terreno que pertence à União, e automaticamente isso encerraria o sonho de oficializar o local como Parque, dando a ele uma maior estrutura, preservação e qualidade de vida, sendo este o objetivo da grande maioria dos moradores e da Associação dos Amigos do Bairro Belvedere.
Anteriormente a Prefeitura de Nova Lima almejou esta área para a criação uma via estruturante como um novo acesso para a cidade e de melhorias no trânsito local para até 40.000 veículos por dia (confira ao fim do texto), que em sua concepção aproveitaria um trecho do ramal da linha férrea conectando o Anel Rodoviário ao bairro Mingu, na parte debaixo do centro de NL. Porém o “Parque Linear”, de mais ou menos 2 quilômetros de extensão, está localizado em Belo Horizonte, e a cidade não conseguirá realizar a obra desejada sem a participação da prefeitura da capital.
Com o possível desenvolvimento desta rodovia, o alerta é para as consequências que esta interferência poderá trazer, pois nesta região existem diversas glebas de terra, que poderão se transformar em bairros e loteamentos, com potencial de ocupação para milhares de novos moradores, gerando um enorme estrago ambiental local e aumentando drasticamente o fluxo no Anel, gerando um verdadeiro caos urbano.
Diversos moradores se mostram contrários a esta venda e buscam chamar atenção da sociedade e de outras autoridades para as consequências desta expansão urbana na região. Personalidades mineiras como os músicos Samuel Rosa e Henrique Portugal aderiram a campanha e divulgaram vídeos de apoio a criação do parque (clique aqui e assista). O Balcão News conversou com Álvaro Gonzaga, morador e coordenador do projeto Parque Linear do Belvedere:
“Estamos vivendo uma queda de braço entre quem valoriza o ambiental e social contra o poder econômico. Ou é parque e faz preservação ou é rodovia e prédio”, exclamou. “Não somos contra o crescimento da cidade de Nova Lima, mas não podemos apoiar um crescimento desordenado e sem planejamento. Tínhamos aberto um diálogo com as construtoras, mas em determinado momento eles sumiram e o terreno foi incluído nesse edital de venda do Governo”.
Álvaro destacou a falta de conhecimento do Governo Federal sobre a área e faz um alerta para a atitude, “a burocracia de Brasília não conhece os pormenores desse “Parque” e o comparam por exemplo com o antigo prédio abandonado do Dnit, na Av. Prudente de Morais. Com isso a área está sendo vendida como se fosse um prédio comercial, o que está muito longe de ser”, observou o morador. “Esse “Parque” precisa ser removido do edital e ser melhor analisado pelos órgão responsáveis, pois não estão sendo levadas em consideração as necessidades de preservação e os impactos ambientais que isso pode acarretar para Belo Horizonte”.
Quem também se indigna com o fato é o morador Jamil Roiz, que valoriza os benefícios do Parque para os residentes:
“É seguramente uma oportunidade única e última para se estruturar uma área de convivência com inúmeros atrativos e voltada ao lazer e à prática comunitária não só da população da região como de todos os belo-horizontinos e região metropolitana. O Projeto existe, elaborado por gente extremamente capaz, os recursos para a execução já estão assegurados e não gastarão nenhum centavo do poder público, mas a especulação imobiliária tem outros planos para o local”.
Problema gravíssimo de trânsito:
Por outro lado, o empreendedor imobiliário e morador da região há 22 anos, Alexandre Gribel tem uma visão diferente e questiona se o Parque Linear seria a melhor solução para os moradores:
“Temos um problema gravíssimo de trânsito e isso precisa ser resolvido. Sou contra a ocupação imobiliária da linha, como também sou contra a implementação do “Parque Linear”. O município não tem verba para realizar as obras do parque, e automaticamente algum empreendedor irá explorar o local. Com isso vão surgir comércios e alguém estará ganhando muito dinheiro, que não sei quem é”.
Para Gribel, a solução está entre alinhar o uso para o lazer da população e o escoamento do trânsito dos moradores, “acho que a área deveria ser utilizada para o lazer, mas também se transformar em uma via de saída. Precisamos de um planejamento de trânsito local naquela área, e quem causou este grande problema do tráfego de veículos fomos nós, moradores do Belvedere e Vila da Serra. O brasileiro tem de parar com essa besteira de ‘depois de mim ninguém pode’. Essa área pode beneficiar a todos. Tenho certeza que o Ministério Público, através do Procurador Geral Jarbas Soares, está liderando um trabalho com empreendedores e município para se achar uma solução.
Os próximos passos
Para frear a possível venda, Álvaro informou ao BN os planos futuros, que contam com a participação e conscientização da população:
Criamos um perfil no instagram (@parquelinearbh) que já tem mais de 4 mil seguidores em duas semanas. Vamos dar publicidade a essa questão para que toda a população de BH tome conhecimento do que está acontecendo e venha visitar e usufruir desta área. Precisamos que todos saibam do que está ameaçado com esta possível venda, principalmente olhando para as gerações futuras.
A opinião é compartilhada por Jamil, que valoriza a luta dos moradores e da associação, “a luta pela criação do Parque Linear é a luta contra a irracionalidade daqueles que são pagos pela sociedade para planejar em prol da comunidade e de seu futuro, contra os interesses poderosos que se sobrepõem aos interesses da população e como afirmação da autonomia do indivíduo que tem que se organizar para fazer prevalecer oque convém ao cidadão em linha com as práticas modernas desvencilhadas dos velhos interesses e que determinam as cidades no mundo de hoje”, finalizou.