A Comissão de Educação, Ciência e Tecnologia da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) se reuniu ontem, com especialistas da área médica, entre outros, para discutir a importância da acessibilidade ao tratamento com a cannabis.
O psicólogo Augusto Vitale Marino, que presidiu o Instituto de Regulamentação e Controle de Cannabis no Uruguai, foi o primeiro convidado ouvido em audiência pública sobre ouso medicinal da planta. Ele contou a experiência uruguaia e falou em especial sobre a importância de se construir uma política não apenas para a regulamentação do uso, mas também da acessibilidades aos produtos gerados pela cannabis.
O psicólogo Augusto Marino, e outros convidados destacaram que é um equívoco separar os princípios ativos da planta, considerando alguns (em especial o CBD) como benéficos e outros (com destaque para o THC) como maléficos. Para Augusto Marino, a discussão se dá em um contexto de mudança internacional de paradigma, baseado na superação do modelo proibicionista em relação à cannabis. Apesar dessa superação estar em discussão e implementação em diversos países, há ainda desafios.
Segundo o psicólogo, a cannabis continua, na convenção internacional sobre drogas, classificada como substância com efeitos maléficos equiparáveis aos da heroína. Para ele, isso seria um erro, que não leva em consideração as evidências científicas que falam em favor da planta.
Ao compartilhar a experiência uruguaia, ele destacou que o país foi um dos pioneiros em regulamentar a planta em 2013 sem limitar seus usos, permitindo inclusive o uso recreativo. Por isso, não havia parâmetros claros e até as evidências científicas em favor do uso medicinal estavam se consolidando. Assim, a lei que legalizou a cannabis passou por diferentes regulamentações ao longo dos anos e foi reformada em uma nova legislação em 2019.
Ele explicou que as reformas buscaram, em especial, melhorar a acessibilidade de pessoas que precisavam da cannabis para uso medicinal. Segundo o convidado, inicialmente, a regulamentação usava o conceito de “especificidade farmacêutica”, que trata os princípios ativos da cannabis separadamente. Porém, como ele explicou, pesquisas mais recentes indicam que os benefícios muitas vezes não se baseiam em princípios isolados.
Também foi construída a ideia de associações de pacientes como maneira de melhorar o acesso com barateamento dos produtos e construção de redes de apoio para os tratamentos. Augusto Marino destacou que tais associações ainda estão em processo de formalização no Uruguai e, nesse ponto, o Brasil já está à frente.
A presidente da Associação Tijucanna, a agrônoma Adriana Gomes de Moraes, ressaltou que elas nascem exatamente na busca de melhorar o acesso aos produtos medicinais feitos a partir da cannabis. Elas ajudam pessoas que precisam do tratamento a encontrar os caminhos para obter os produtos, de alto custo, e atuam em conjunto com profissionais da saúde, viabilizando terapias necessárias para complementar os tratamentos.
Mas, para Adriana de Moraes, essas associações contribuem também no âmbito do desenvolvimento científico. Ela destacou a parceria com universidades e institutos de pesquisa, de forma a facilitar o entendimento sobre os efeitos da cannabis em cada enfermidade, bem como a compreender dosagens e avaliar o impacto de outras terapias, por exemplo.
Essas parcerias seriam úteis em especial no contexto em que o desenvolvimento científico sobre a cannabis é dificultado pela proibição da planta. Como explicou Jacqueline Aparecida Takahashi, pró-reitora adjunta de pesquisa da UFMG, atualmente há obstáculos para levar a planta ao laboratório, reduzindo o ritmo das pesquisas.
Nessa linha, o advogado e vice-presidente da Associação de Cannabis Medicinal de Belo Horizonte (Angatu), Lucas Candini Soares, que tem atuação similiar à Tijucanna, anunciou que já em outubro a entidade também vai pedir à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) autorização para cultivo do vegetal.
“Atualmente, entre as associações em Minas Gerais, apenas a Tijucanna dispõe disso. Lutamos para provar que as associações podem ser cultivadoras para também fornecer matéria-prima para o Sistema Único de Saúde (SUS), revertendo o cenário atual de muitas ações na Justiça que obrigam o Estado a comprar os medicamentos, que são muito caros”, aponta.
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