Representantes de sindicatos de trabalhadores da educação recomendaram que tenha mais debate sobre o uso do celular em sala de aula nas escolas da capital.
Na reunião de ontem, da Comissão de Educação, Ciência, Tecnologia, Cultura, Desporto, Lazer e Turismoda Câmara Municipal de BH, eles ressaltaram que, diante da realidade de violência, bullying, depressão e ansiedade, agravada pela falta de infraestrutura e conectividade, muitos docentes estariam concordando com a legislação proposta em projeto de lei que tramita na Câmara .
A Comissão de Educação da Câmara dos Deputados aprovou projeto de lei que proíbe o uso de telefone celular e de outros aparelhos eletrônicos portáteis por alunos da educação básica em escolas públicas e particulares, inclusive no recreio e nos intervalos entre as aulas.
Além de proibir o uso, o texto proíbe também o porte de celular por alunos da educação infantil e dos anos iniciais do ensino fundamental, como forma de proteger a criança de até 10 anos de idade de possíveis abusos.
A proposta, segundo a Agência Câmara de Notícias, autoriza, por outro lado, o uso de celular em sala de aula para fins estritamente pedagógicos, em todos os anos da educação básica. Permite ainda o uso para fins de acessibilidade, inclusão e condições médicas.
Representando a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), Maria do Carmo Melo ressaltou que há prós e contras no uso dos celulares nas escolas. A especialista apontou os riscos do uso excessivo de dispositivos eletrônicos por crianças e adolescentes, destacando as questões ligadas à saúde mental, obesidade, prática de bullying e exclusão digital, como pontos negativos, mas considerou a importância da formação digital dos estudantes, uma vez que várias escolas adotam plataformas digitais de ensino.
Ela lembrou que a SBP orienta limites claros para o tempo de exposição à tela. “Antes dos 2 anos, o uso deve ser inexistente. De 2 a 5 anos, até duas horas por dia; acima de 5 anos, no máximo três horas. Queremos que as crianças manuseiem tecnologia, mas é preciso proteger a infância para formar adultos saudáveis”, ponderou.
Já Maria Cristina Silva, da Faculdade de Educação da UFMG, relacionou o debate à saúde mental das crianças e adolescentes. “A infância mediada pelo celular traz desafios como a perda da corporeidade e o sofrimento causado por padrões sociais impostos pelas redes. Proibir ou não é importante, mas precisamos oferecer alternativas, como espaços para brincar e maior contato com a natureza”, observou a professora.
Os impactos pedagógicos da questão foram destacados por Larissa Santos Ciríaco, da Faculdade de Letras da UFMG, que mencionou movimentos nacionais e internacionais contra o uso indiscriminado de telas. A professora lembrou que no Rio de Janeiro já existe uma lei em vigor, que vem apresentando bons resultados. Além disso, destacou a pobreza linguística decorrente do uso excessivo desses dispositivos, o que vem comprometendo a capacidade de compreensão e produção textual das crianças e dos adolescentes.
Por outro lado, Guilherme Carvalho Franco, do Centro Pedagógico, defendeu a educação digital em lugar da proibição. O educador, que trabalha com jovens entre 12 e 15 anos, acredita que o celular na escola é uma oportunidade para o ensino de habilidades como o uso responsável e moderado das telas, processo que muitos pais não têm tempo para desenvolver em casa com seus filhos. Ele concordou que há uma relação entre sofrimento mental e uso excessivo do celular, mas disse que não há literatura que comprove relação de causa e efeito. “Proibir celulares prejudica a autonomia dos professores e o desenvolvimento dos estudantes. Precisamos educar para os riscos e usar a tecnologia como ferramenta pedagógica”, defendeu.
Sind-UTE
Marcelle Amador, do Sindicato Único dos Trabalhadores em Educação de Minas Gerais (Sind-UTE), apresentou dados que indicam apoio à proibição. Segundo a representante da entidade, em pesquisa realizada em 660 cidades mineiras, 94% dos professores relataram problemas com o uso inadequado de celulares e 63% se colocaram totalmente contra os dispositivos no ambiente escolar, inclusive no horário do recreio. “Para muitos, a proibição seria uma solução frente à precariedade estrutural e à falta de inclusão digital nas escolas”, ressaltou.
Já Diana de Cássia Silva, do Sindicato Único dos Trabalhadores em Educação da Rede Pública Municipal (Sind-Rede/BH), alertou para os episódios de violência, racismo e bullying associados ao uso de celulares nas escolas e defendeu a necessidade de uma formação adequada dos professores para trabalhar o letramento digital dos estudantes. A professora afirmou que a construção de um texto que regule essa questão precisa incluir as contribuições dos trabalhadores, e solicitou a realização de um seminário sobre o tema antes da apresentação de um projeto de lei.
Participando também da audiência, o Secretário Municipal de Educação, Bruno Barral, disse que a proibição não deve ser o caminho trilhado nesta construção e reconheceu que é necessário avançar no rumo da educação para uso responsável dos dispositivos, respeitando a autonomia dos docentes e os arranjos locais da comunidade.
Próximos passos
Os representantes concluíram que é necessário políticas públicas adaptadas às diferentes realidades. Dr. Bruno Pedralva destacou a importância de construir uma proposta local, com foco na regulamentação do uso responsável dos dispositivos, e se comprometeu a promover um seminário sobre o tema na Casa. “Esperamos, a partir de janeiro de 2025, ter uma lei construída em conjunto, envolvendo os vereadores, as entidades e a Secretaria Municipal de Educação”, finalizou.